21 novembro 2016

CANÇÃO (SONG)


O peso do mundo
       é o amor.
Sob o fardo 
       da solidão,
sob o fardo 
       da insatisfação

       o peso,
o peso que carregamos
       é o amor.

Quem o pode negar?
      Em sonhos,
toca-nos 
      o corpo,
em pensamentos
      constrói
o milagre,
      na imaginação
angustia-se
      até nascer
humano

- sai para fora do coração
      ardendo com pureza -
pois o fardo da vida
      é o amor,
mas nós carregamos o peso
      fatigados
e assim precisamos de descansar
nos braços do amor
      finalmente,
precisamos de descansar nos braços 
      do amor.

Nenhum descanso
      sem amor,
nenhum sono
      sem sonhos
de amor -
      quer eu esteja louco ou com frio,
obcecado por anjos
      ou máquinas,
o último desejo
      é o amor
- não pode ser amargo,
      não pode negar,
não pode ser contido
      se negado:

o fardo é demasiado pesado

      - é preciso dar
para nada retornar
      como pensamentos
dados
      na solidão
em toda a excelência
      do seu excesso.

Os corpos quentes
      brilham juntos
na escuridão,
      a mão move-se
para o centro
      da carne,
a mão treme
      de felicidade
e a alma sobe 
      feliz até aos olhos -

sim, sim,
      era o que
eu queria,
      o que eu sempre quis,
o que eu sempre quis,
      regressar
ao corpo
      onde nasci.


Allen Ginsberg
(tradução da minha autoria, for english version click HERE)

Imagem: Estátua "O beijo" do escultor romeno Constatin Brancusi (1908)

Nota: Nascido em Newark, New Jersey a 3 Junho 1926, Ginsberg foi um poeta americano da geração beat, que serviu de inspiração para a personagem Alvah dos “Vagabundos da Verdade” de Jack Kerouac. Foi uma criança complicada assombrada pela paranóia da sua mãe. Na escola secundária, encanta-se com a obra Walt Whitman, embora acabe por cursar Direito na Univerdade de Columbia onde faz amizade com um grupo de jovens insubmissos (entre os quais Lucien Carr e Kerouac), interessados em drogas, sexo e literatura. Ginsberg acreditava que seguiam em direcção a uma grande visão poética, que ele e Kerouac chamavam New Vision. Experimentou anfetaminas e canábis e começou a frequentar bares gay, iniciando um relacionamento com Neal Cassady, que vistava em Denver e S. Francisco. Assumindo um estilo de vida bizarro, aos 29 anos, já tinha escrito muita poesia, mas quase nada publicado. Ganhou popularidade a partir de 55 com o seu poema “Uivo” (considerado por muitos, obsceno e pornográfico). Foi o livro de poesia mais vendido da história dos EUA, ultrapassando um milhão de exemplares, seguido por vários outros poemas importantes. Ginsberg viaja pelo mundo, descobre o budismo e apaixona-se por Peter Orlovsky (seu companheiro pelo resto de vida, embora a relação não fosse exclusiva). No início dos anos 1960, enquanto sua celebridade crescia, Ginsberg lança-se na cena hippie, ajuda Timothy Leary a divulgar o LSD e participa em muitos eventos (ex: o “Human Be-In”, S. Francisco, 1967). Foi também figura-chave nos protestos contra a guerra no Vietname, em 1968. Após conhecer o lama tibetano Trungpa Rinpoché, aceita-o como seu guru pessoal e com a poeta Anne Waldman, cria uma escola de poesia. Participando sempre em eventos multiculturais até à sua morte a 5 Abril 1997, entre seus maiores admiradores, estavam os múiscos Jim Morrison (The Doors), os The Clash e os The Cult por exemplo. Foi um dos expoentes do movimento beat, grupo de autores que trabalhavam com poesia, prosa e consciência cultural. A sua escrita oscilava entre o mantra e o sexo explícito, o sagrado e o profano, o espiritual e o material. Transitava entre dois mundos: o da marginalidade e o da cultura erudita. A utopia de Ginsberg era a de uma sociedade harmoniosa, onde coubessem os loucos e todos os contextos estranhos.

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