Toma-me, ó noite eterna, nos teus braços
E chama-me teu filho... eu sou um rei
que voluntariamente abandonei
O meu trono de sonhos e cansaços.
Minha espada, pesada a braços lassos,
Em mão viris e calmas entreguei;
E meu ceptro e coroa - eu os deixei
Na antecâmara, feitos em pedaços
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Minha cota de malha, tão inútil,
Minhas esporas de um tinir tão fútil,
Deixei-as pela fria escadaria.
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Despi a realeza, corpo e alma,
E regressei à noite antiga e calma
Como a paisagem ao morrer do dia...
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Fernando Pessoa
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Nota: mais um bem conhecido, mas nem por isso menos pertinente, do Pessoa. Porque sim. Num primeiro nível, porque bastas são as vezes em que apetece abdicar, regressar "à noite antiga e calma". Finalmente, e a outro nível, há vezes em que se deve mesmo saber abdicar, pois sem algum despojamento em relação ao nosso trono, ao ceptro e à espada, nunca seremos mais do que tronoceptroespada, e nada mais nos restará se um dia os viermos a perder.
4 comentários:
toma-me com os braços bem abertos....
Dal,
Pois a mim já me tomou. E tem-me tomado, e bem... cada um com a sua sina.
uUma visão muito budista da realidade, esse despreendimente de que falas...
Quando precisares de desabafar liga ou envia um mail...
Beijo
CSD
Cláudia,
Em breve falaremos (espero).
A sessão é Quarta dia 16, sim (respondendo ao teu outro comment).
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