05 junho 2007

TROVA DO EMIGRANTE


Parte de noite e não olha
Os campos que vai deixar
Todo por dentro a abanar
Como a terra em Agadir
Folha a folha se desfolha
Seu coração ao partir

Não tem sede de aventura
Nem quis a terra distante
A vida o fez viajante
Se busca terras de França
É que a sorte lhe foi dura
E um homem também se cansa

As rugas que o suor cava
Não são rugas são enganos
São perdas lágrimas e danos
De suor por conta alheia
Não compensa nunca paga
Quanto suor se semeia

Em vida vive-se a morte
Se o trabalho não dá fruto
Morre-se em cada minuto
Se o fruto nunca se alcança
Porque lhe foi dura a sorte
Vai para terras de França

Não julguem que vai contente
Leva nos olhos o verde
Dos campos onde se perde
Gente que tudo lhe deu
Parte mas fica presente
Em tudo o que não colheu

Verde campo verde e triste
Em ti ceifou e hoje foi-se
Em ti ceifou mas a foice
Ceifava somente esperança
Nem sempre um homem resiste
Vai para terras de França

Vai-se um homem vai com ele
A marca de uma raiz
Vai com ele a cicatriz
De um lugar que está vazio
Leva gravada na pele
Uma aldeia um campo um rio

Ficam mulheres a chorar
Por aqueles que se foram
Ai lágrimas que se choram
Não fazem qualquer mudança
Já foram donos do mar
Vão para terras de França.


Manuel Alegre

3 comentários:

Dalaila disse...

Foi bom ouvir este poema, em noite fria.

Anónimo disse...

O poema é bom de se ler e ouvir em qualquer altura, embora o seu conteúdo lembre momentos dolorosos.
L. D.

Claudia Sousa Dias disse...

Pois, Adadir parece ser um bom refúgio...


CSD


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