na minha hora
mais amarga e tenebrosaestou sozinho
nos minutos infindáveis
de cada hora que passa
sequiosamente
bebo a minha própria taça
de cicuta
quando a noite se adensa e eterniza
quando as agonias
lascas afiadas
laceram a carne da alma
em sangue de espírito vivo
agora que a sarça ardente
e lambe sofregamente
as frágeis paredes
que me protegem do mundo e de mim
ameaça tornar-se finalmente visível
a eterna combustão
que me consome
ardo tranquilamente
em silêncio
na noite
porque nesta hora
não resta ninguém
capaz de presenciar as minhas causas
e razões
(inclusive a falta delas)
capaz de testemunhar a minha loucura
(ou será lucidez por fim? até que enfim...!)
de me amparar ou empurrar para o abismo
(ambos actos de misericórdia
e de compaixão)
quedo-me inânime
por terra
a pensar no que poderia ter sido
e não no que pode vir a ser
quase...
quase...
as minhas asas não possuem força
o vento deixou de as embalar com o seu sopro
está tudo tão manso lá fora
quietude geral que se demora
nessa outra
escuridão fora de mim
é agora
está na hora
quase...
quase...
FIM
(quase...)
(ah, as valquírias, as valquírias...
Kára chamou também por ti...?)
Luis Beirão
Imagem: The Ryde of the Valkyrs (1909), quadro de John Charles Dollman
Aconselha-se leitura a ouvir ISTO
2 comentários:
Já tinha saudades de um poema escrito por ti.
Este foi a pensar no Sá... e noutras coisas...
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