18 setembro 2008

OBRA-PRIMA


Quando a tua mão acaricia a minha perna
os sensores da pele desencadeiam reacções sentimentais
e às vezes chego a ter uma reacção motora.
O ângulo da perna, a inclinação do pé –
maravilhas-te com a paisagem ocasional:
depois da curva da estrada
estabilizas o olhar na curva do joelho.
Os olhos impacientam-se em sacudidelas invisíveis
mas o espelho reflecte apenas imobilidade.
A sandália: o teu olhar vai do joelho à nudez do pé.
Este pé que calcorreia as ruas é também objecto de desejo:
Este pé que calca o travão a fundo.
Sei que vais beijar-me – talvez nem tu saibas
que a postura do teu corpo tem o formato de beijo.
A carícia necessita de um encontro minucioso,
da pressão exacta para que não me esmagues a rótula.
O contacto é doce na pele que te ofereço,
a carícia é a obra-prima da engenharia mecânica.
Olho a baía onde se reflectem os néons da noite
e deixo o corpo trabalhar à vontade.
Depois adormeço com a tua mão na minha perna
e a vaga consciência de que o paraíso se estende
da ponta dos pés até ao cimo da cabeça.


Rosa Alice Branco
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Sobre a autora: nasceu em Aveiro (1950). Doutorada em Filosofia, é professora na Escola Superior de Artes e Design de Matosinhos e investigadora no Departamento de Comunicação e Arte na Universidade de Aveiro. Tem 8 livros de poesia publicados em Portugal, incluindo a sua obra reunida: Soletrar o Dia. Já foi publicada em diversas línguas. Nota: Separações e negritos da minha responsabilidade, para facilitar a leitura. Consultar sempre o original.

5 comentários:

Claudia Sousa Dias disse...

belo pé e bela perna

um abraço


csd

Luis Beirão disse...

Olá Cláudia,

Belo poema, isso sim. ;-)

Bjs,
Luis

Claudia Sousa Dias disse...

também...

um beijinho


CSD

Dalaila disse...

eu amo rosa alice branco, amo, amo!

Luis Beirão disse...

Ainda bem Dal, que de vez em quando se pode colocar aqui alguma coisa que te agrade... fico contente!

Bjs,
Luis


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